A devoção a Deus e uma vida piedosa, no
período conhecido como idade primitiva e antiga, eram sinônimos de um
relacionamento profundo com o Criador e, consequentemente, equivalente a uma
espiritualidade cristocêntrica. Atualmente, a prática das disciplinas
espirituais como oração, jejum, solitude, simplicidade, humildade, meditação,
estudo da Palavra de Deus, confissão, adoração, são vistas como parte do
processo de formação espiritual, símbolo de uma vida espiritual saudável.
Talvez os antigos tenham sido mais
felizes em ter simplificado todas as práticas espirituais na expressão vida piedosa. Hoje, porém, existe um
arsenal de métodos e fórmulas que prometem o desenvolvimento espiritual a fim
de aproximar cada vez mais o homem de Deus, já que o pecado trouxe tão grande
afastamento.
A relativização dos valores sagrados
pode ser uma das causas do falso pietismo pregado e vivido pela Igreja na
atualidade. Já não é mais visto, vivido ou ensinado aquilo que Jesus pregou ser
essencial para uma vida de devoção completa a Deus. O ativismo tomou o lugar da
expressão do caráter e o “ter” e o “fazer” tornaram-se mais importantes do que
o “ser”. Isso, até o ponto de a sociedade pós-moderna discriminar o correto
advogando o incorreto justificado por qualquer fim perenemente benéfico.
Outra questão observada é o
individualismo que trouxe uma busca frenética, desenfreada, por uma felicidade
utópica. A discórdia é praticada porque o senso de comunidade foi deturpado. Através
dos tempos, o pensamento humano tornou-se subjetivo e a pós-modernidade
concretizou a subjetividade como estilo de vida. Os padrões outorgados por Deus
desde a criação podem ser ou não ser, dependendo da questão. Isso fez com que o
senso de pecado fosse atenuado e não mais a paz de Cristo é o arbitro do
coração. O santo e o profano podem ser essencialmente equivalentes.
O homem, então, vive de superficialidade no
seu relacionamento com Deus e com os seus semelhantes. As bases familiares da
sociedade contemporânea estão falidas e a formação do caráter ocorre
estritamente em ambientes não nucleares, confiando à Igreja a responsabilidade
na construção do caráter da pessoa. Com isso, a Igreja assume o papel que não
lhe pertence de praxe.
Além desses grandes desafios, a
Igreja cristã passa por uma fase atípica, sendo que em vez de os pastores
evangélicos cuidarem de muitos membros em suas igrejas, os membros é que
possuem vários pastores. Esta descontinuidade no trabalho de ensino e
discipulado dentro das igrejas culmina na deficiência da formação espiritual do
homem.
Indubitavelmente,
com todo esse pano de fundo, o homem é influenciado a viver a irrelevância do
conhecimento de Deus, fazendo da própria Palavra de Deus fonte de informação e
conhecimento inaplicável em sua vida pessoal ou espiritual. Como consequência,
o distanciamento de Deus é maior. Isso favorece ainda mais a não vivência de um
padrão de espiritualidade cristocêntrico.
Em contrapartida com o falso
pietismo, o legalismo dogmático é o outro extremo. Ambos encontram-se em
evidência na sociedade contemporânea. Por uma vida completamente dedicada à
prática doutrinária, sacrifica-se a caridade, a oração, o jejum e a experiência
relacional com Deus. Pais da Igreja Cristã como Irineu, Orígenes, Agostinho e
Gregório já falavam da fusão entre a Teologia e a Oração; doutrina e devoção;
conhecimento e amor. Em termos modernos seria um calvinista de mente e
pentecostal de coração.
A solução certamente não seria viver
um escolasticismo moderno, muito menos o gnosticismo combatido veementemente
pelo apóstolo João em seus escritos. Mas, evidenciar uma visão contundente da
integralidade do ser, sendo corpo, alma e espírito intimamente ligados, sem
possibilidade de partição.
Para os cristãos da atualidade, o
desafio é viver o Evangelho Integral de Cristo aplicando-o holisticamente no
seu ser. A prática das disciplinas espirituais pode ajudar no desenvolvimento
de uma espiritualidade cristocêntrica, apesar de não se tratar da única forma
de relacionar-se com Deus.
Outras práticas se fazem necessárias
para a promoção de uma espiritualidade cristocêntrica. Faz-se necessário o
despir-se do velho homem que se corrompe por desejos enganosos, a fim de ter o
seu modo de pensar renovado. A partir desta renovação de mente, é necessário o
revestimento do novo homem, criado para ser semelhante a Deus em justiça e em
santidade oriundos da verdade (paráfrase
de Efésios 4.22-24).
São grandes os desafios, entretanto,
estes princípios colocados em prática podem desenvolver a almejada espiritualidade
cristocêntrica.
Por: Pr Paulo Pedroso.
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